terça-feira, 30 de agosto de 2011

Entrevista com Roselis Batista Ralle

Quando entrevistei Políbio Alves pela primeira vez ele me contou que havia uma professora da Universidade de Reims Champagne-Ardenne (França) que estudava sua obra no curso de Letras Neolatinas. Esta professora era a Doutora Roselis Batista Ralle, nascida em Santos, porém filha de paraibanos (inclusive do notável jornalista Oduvaldo Batista que trabalhou dentre outros jornais no O Norte).
Quando tive a ideia de fazer uma grande reportagem sobre a vida de Políbio e sua obra eu percebi que precisava conversar com Roselis de alguma forma. Confesso que fiquei um pouco preocupada em como essa entrevista aconteceria, pois ela morando na França seria inviável manter uma conversa por telefone. O jeito seria entrar em contato por email ou Skype, se ela aceitasse.
Eis que o destino dá uma forcinha e, quando liguei para Políbio há uns dias para perguntar se ele topava ser objeto do meu TCC, ele comenta comigo que a professora Roselis está no Brasil, especificamente em João Pessoa. Sorte maior eu não poderia ter. E assim consegui conversar com Roselis Batista Ralle pessoalmente no dia 29 de agosto de 2011 (ontem).
Roselis, linguista e professora de Literatura Latinoamericana, divulga e estuda a obra de Políbio com alunos de várias nacionalidades desde 2006. Após suas análises do livro "Varadouro", ela passou a defender a tese de que Políbio faz parte da nova geração de escritores épicos. Mais que isso, ele possui um gênero próprio de épico, sugere ela.
A explicação: os épicos são gêneros literários clássicos que se caracterizam por narrar saga de um herói. Este, via de regra, é se carne e osso como no caso de Ulisses em "Odisseia" e Aquiles em "Ilíada", ambas epopeias atribuídas a Homero ou a saga de Eneias em "Eneida", do escritor latino Virgílio. Já na Idade Moderna é possível citar "Os Lusíadas", de Luís Vaz de Camões, um épico genuinamente português, que narra a descoberta do caminho marítimo da Índia por Vasco da Gama.
Roselis explica que as epopeias por muito tempo deixaram de ser escritas. "Talvez pela escassez de heróis", cogita ela. O fato é que com a evolução das sociedades, os escritores de certa forma deixaram de exaltar pessoas por falta de interesse - ou de personagens que valessem o elogio. A partir de meados do século XIX, os heróis voltaram ao cenário mundial, sobretudo na América Latina, onde as lutas pelas independências das colônias se intensificavam.
Todos os países da América possuem registros literários sobre seus "heróis". Estes são, em sua maioria, homens políticos como Simon Bolívar referência para a Bolívia, Colômbia, Equador, Panamá, Peru e Venezuela; José Gervasio Artigas, no Uruguai; Emiliano Zapata, no México; José de San Martín, Argentina e José Martí, considerado o mártir da independência de Cuba. No Brasil, as poesias indianistas de Gonçalves Dias são também consideradas épicos.
Dos autores que escreveram sobre esses "novos" heróis, Roselis destaca a prosa do mexicano Mariano Azuela, autor de "Los de Abajo" (1915), que trata da Revolução Mexicana. Entre tantos autores da chamada "retomada do épico" está Políbio Alves. O brasileiro - e paraibano - ocupa entretanto um lugar único neste gênero. "Varadouro" é um épico que invoca o Rio Sanhauá como herói de sua lira.
"'Varadouro' surpreende por ter um elemento da natureza como herói e isso é inédito na Literatura. Eu estudo literatura de diversos países e trabalho com mais estudiosos que também não têm notícia de terem visto algo do tipo", assegurou-me a professora. "Políbio escreve um épico sensato, com realismo 'pé no chão', não faz uso do engrandecimento cego. Ele mostra as duas faces de seu herói: o rio que nas cheias invade as casas das pessoas é também o rio que dá o alimento delas. O livro surpreende por mostrar um herói que vence desafios e atravessa os anos incólume".
Além das inovações estilísticas, Roselis me chama a atenção para a atualidade da temática abordada em "Varadouro", um livro publicado em 1989 que começou a ser escrito bem antes disso. "O livro mostra a água como fonte de vida e alimento, agregadora de pessoas, fundadora das civilizações, meio de transporte que traz e leva informação entre outras atribuições". Roselis Batista Ralle encerra nossa conversa dizendo o que de certa forma eu já sabia. "Políbio Alves é único".
Fiquei feliz em poder conversar com a professora pessoalmente. Uma oportunidade única em se tratando de uma pessoa tão gabaritada, ocupada, e que mora a milhares de quilômetros de mim (com um oceano no meio do caminho). Durante nossa conversa, ela me deu uma boa notícia que eu, por pouco, esqueço de registrar aqui: O primeiro livro de Políbio, "O Que Resta dos Mortos" (Contos) está sendo traduzido para o francês pelos alunos do grupo que ela coordena na Universidade de Reims. "Traduzir poesia é uma coisa complicada por si só, traduzir a de Políbio é então uma missão bastante difícil. Então decidimos começar pela prosa", disse. O livro em questão já foi traduzido para o espanhol, "Lo que queda de los muertos", em uma edição cubana. "Varadouro" também possui uma versão em espanhol e o livro "Exercício Lúdico - invenções e armadilhas" já foi traduzido para o inglês.

Um comentário:

  1. - Quando é que as livrarias paraibanas vao ter uma estante - ou mesmo que seja apenas uma fileira de uma estante - com obras de paraibanos - escritores e poetas, historiadores e criticos ? Vou e venho todos os anos a Joao Pessoa, a Alagoa Grande, etc., e nao acho esse joio. Se os paraibanos nao dao vqalor aos seus talentos, se nao os divulgam, muito dificil sera .
    Roselis BATISZTA R em set. de 2013

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